O crescimento pessoal por meio da maternidade
10/05/2024

A maternidade é uma jornada única, repleta de desafios e aprendizados que moldam não apenas os filhos, mas também as próprias mães. Desde as tarefas mais simples até as mais complexas, cuidar de uma vida em crescimento é uma experiência intensa que inevitavelmente impulsiona o crescimento pessoal. Em uma jornada de empatia e autoconhecimento Bárbara Olsen Cecatto, psicóloga e mãe do Theo, dedica sua vida profissional e pessoal à compreensão e ao desenvolvimento da inteligência emocional, tanto em crianças quanto em adultos.
Sua jornada começou aos 14 anos, quando atuou como monitora em uma escola, encantando-se com a turminha da pré-escola. Essa experiência foi o ponto de partida para uma carreira que se direcionaria gradualmente para a psicologia infantil e familiar. Durante a faculdade, Bárbara se envolveu como acompanhante terapêutica escolar, solidificando ainda mais sua paixão por esse campo. "Fiz mestrado em psicologia clínica, estudando o bullying e fui percebendo, pouco a pouco que a alfabetização emocional das pessoas é a chave para uma vida mais leve e conectada com a nossa própria essência", diz.
De acordo com a psicóloga, cada mulher enfrenta sua própria jornada materna, marcada por experiências e transformações singulares. Algumas enfrentam momentos de decisões difíceis, como abdicar temporariamente da carreira profissional para se dedicar integralmente a um recém-nascido, enquanto outras percebem a importância de equilibrar as necessidades pessoais com as responsabilidades maternas para garantir não só a própria sobrevivência emocional, mas também a do filho.
No entanto, muitas mulheres se veem lutando contra um sentimento persistente de culpa quando dedicam tempo para si mesmas. A imagem idealizada da mãe abnegada, que prioriza os filhos em detrimento de si mesma, permeia a sociedade e gera expectativas irrealistas. Nos dias das mães e em muitas mensagens culturais, a figura da mãe é retratada como aquela que sacrifica tudo por seus filhos, sem espaço para suas próprias necessidades e desejos.
Essa pressão social pode levar as mães a se sentirem egoístas ao buscar momentos de autocuidado. No entanto, segundo Bárbara, é fundamental desafiar essas normas sociais e promover uma mudança de mentalidade. É preciso reconhecer que cuidar de si mesma não é egoismo, mas sim essencial para o bem-estar geral, tanto da mãe quanto da família como um todo. "Quais são as mensagens vinculadas em todos os meios no dia das mães: “aquela que faz tudo pelos filhos”, “aquela que cuida de todos antes de olhar pra si”, “aquela que zela, se preocupa e bla bla bla”… Olha o peso que a sociedade coloca em cima das mães! Olhando por esse prisma, fica óbvio entender porque nos culpamos a olhar pra gente: porque a sociedade não espera que façamos isso! Mesmo que a pressão venha enrolada e flores e “elogios”, ela existe!", complementa.
Ainda segundo a psicóloga, para superar esse sentimento de culpa, é necessário trazer à tona a realidade da maternidade e promover conversas francas sobre as expectativas irreais impostas às mães. É importante começar a elogiar as mães não apenas quando se dedicam exclusivamente aos filhos, mas também quando reservam tempo para si mesmas. É um processo gradual e individualizado, onde as mães podem desafiar a culpa ao agirem em prol do seu próprio bem-estar, mesmo que inicialmente se sintam culpadas.
–Como podemos superar isso? Trazendo essa realidade a tona! Conversando sobre isso, parando de elogiar as mães só quando elas fazem “tudo" pelo outro. E num processo mais individualizado, a gente supera um pouquinho essa culpa quando a gente age mesmo com culpa. Quando a gente faz algo por nós mesmos mesmo se sentindo culpada. Até que a culpa diminua! Ninguém pergunta para os pais “com quem estão seus filhos?”se os encontramos jogando um futebol, um baralho ou fazendo um churrasco. Por que ainda olhamos torto para uma mãe que sai para jantar com as amigas?– diz, Bárbara.
Integrando a experiência pessoal à prática profissional
A chegada de Theo, seu filho, transformou profundamente a perspectiva de Bárbara sobre a maternidade e sua prática como psicóloga. Ela percebeu que as teorias convencionais muitas vezes não captam a complexidade da criação de uma criança. Antes de ser mãe, Bárbara admitia julgar as escolhas parentais, mas a vivência materna a levou a uma compreensão mais profunda e empática.
– Com um filho em casa, pude entender de um lugar muito mais profundo as dificuldades da criação de uma criança. Infelizmente, a psicologia precisa de muitas mudanças - muitas teorias e práticas ainda vem de um lugar de pouco acolhimento e empatia, vem de práticas que não levam em conta o bem estar emocional das pessoas-. Antes de ser mãe, eu olhava para as crianças de um lugar muito mais de julgamento, sabe? Os pais também. Era comum (e eu não me orgulho em contar isso!), eu pensar coisas tipo “mas como eles não colocam limites nessa criança?”. Depois de ter uma ferinha em casa, eu pude entender que o processo é muito mais complexo do que os manuais de psicologia explicam. Então hoje, eu consigo ter muito mais flexibilidade com a criança e a família, mais empatia com o processo que estão passando, e utilizar as abordagens mais efetivas em cada caso", conta Bárbara.
Encontrando equilíbrio e superando a culpa
A psicóloga reconhece as dificuldades enfrentadas pelas mães em encontrar equilíbrio entre as demandas da maternidade e o autocuidado. Ela ressalta que a sobrecarga materna é sintoma de profundas questões sociais e estruturais. Em vez de simplesmente pressionar as mães a cuidarem de si mesmas, Bárbara defende mudanças sociais significativas. "É muito injusto a gente pegar as mães que estão adoecidas, em burnout, tentando equilibrar duzentos pratinhos e dizer “você precisa olhar pra si mesma”. Percebe como é cruel? Como vira mais uma cobrança na lista interminável de tarefas dela? A coitada da mãe precisa dar conta do trabalho, dos filhos, da casa, do marido (por mais absurdo que soe falar isso!), e ainda precisa achar equilíbrio? Não existe! O que precisamos é de uma mudança social, de políticas públicas de verdade, dos pais assumindo mais o papel de cuidador, de uma licença maternidade mais digna, para que aí sobre espaço na agenda e na cabeça das mães - para que elas possam olhar para elas!", enfatiza a psióloga.
Terapia como ferramenta de transformação
A terapia pode ser um recurso poderoso para as mulheres lidarem com a culpa materna. De acordo com a psicóloga, muitas vezes a culpa vem de expectativas externas e internas irrealistas. Através do processo terapêutico, as mulheres podem desafiar essas narrativas e encontrar uma nova perspectiva sobre a maternidade e o autocuidado. "Um processo terapêutico ajuda no sentido da mulher compreender que muitas vezes a culpa tão intensa que a gente sente, vem de um lugar que não nos cabe. Vem de um lugar de cobrança e expectativas que as vezes a sociedade nos impõe, e as vezes nos mesmas exigimos. Na terapia a gente consegue desmistificar isso", relata Bárbara.
Um recado as mães que estão passando por dificuldades
–A sobrecarga e a exaustão materna é uma realidade que afeta, em maior ou menor grau, todas as mães. Precisamos falar sobre isso, precisamos falar mais abertamente sobre as dores e as delícias da maternidade. Meu filho é a maior alegria da minha vida, mas isso não exclui a parte difícil ou menos graciosa da maternidade. Somos todos luz e sombra, todas as experiências tem facetas positivas e facetas desafiadoras, e a vida da mãe fica mais fácil quando aceitamos isso. Quando trilhamos o caminho do autoconhecimento também conseguimos olhar para as nossas sombras com menos cobrança e auto julgamento. Quando ousamos descansar enquanto a pia está cheia de louça, estamos mudando a realidade. Quando ensinamos aos nossos filhos homens que a casa estar limpa e bem cuidada é responsabilidade de todos, estamos facilitando o caminho das mães da próxima geração, pois eles serão pais mais presentes nos afazeres domésticos. Quando falamos sobre isso em uma matéria do jornal, estamos mudando a realidade. É um trabalho de formiguinha, mãe por mãe, até que todas nós possamos vivenciar uma experiência mais leve.
E, por fim, que a gente possa celebrar essa experiência maluca e intensa que é poder ter a honra de criar e conduzir outro ser humano nesse mundo! Esse é o nosso superpoder!– finaliza a psicóloga, Bárbara Olsen Cecatto.