Bets no ambiente de trabalho: casos reais e como as empresas devem agir para se proteger
Por Carolina Paaz, advogada, Mestre em Direito pela UCS, sócia proprietária da Irion Advogados Associados
O avanço das plataformas de apostas online (bets) no Brasil trouxe um novo e preocupante risco jurídico para as empresas: a ludopatia no ambiente de trabalho. Situações em que empregados utilizam o expediente para apostar, desviam recursos para sustentar o vício ou incentivam colegas a participar já estão chegando à Justiça do Trabalho, e algumas decisões recentes mostram que o problema é real e crescente.
A Consolidação das Leis do Trabalho (art. 482, “l”) prevê a demissão por justa causa para a prática habitual de jogos de azar. Contudo, para que a penalidade seja mantida em juízo, a empresa precisa agir com prova sólida e rapidez na aplicação da sanção. Do contrário, o chamado “perdão tácito” pode reverter a demissão e gerar passivos.
Casos que já chegaram à Justiça e suas decisões:
- Desvio de R$ 53 mil para apostar: no interior do Rio Grande do Sul, uma assistente de vendas de grande rede varejista desviou valores da tesouraria para cobrir perdas em apostas. As câmeras comprovaram o furto e ela admitiu o ato. A justa causa foi aplicada, mas a trabalhadora tenta revertê-la alegando demora da empresa para agir.
Incentivo às apostas durante o expediente: em São Paulo, uma supervisora de cobrança foi demitida por estimular colegas a apostar e prometer ganhos altos. A Justiça manteve a justa causa.
- Uso do expediente para jogar “tigrinho” e roleta: um funcionário de escritório de contabilidade também teve a dispensa confirmada após a empresa comprovar que ele apostava em jogos de azar durante o horário de trabalho.1
Reversão e reintegração: em um dos casos analisados, a justa causa foi revertida por ausência de provas suficientes, e o trabalhador foi reintegrado ao cargo, gerando custos e desgaste para o empregador.
Esses exemplos mostram que o risco é duplo. De um lado, empresas que comprovam e agem rapidamente conseguem manter a penalidade. De outro, a falta de documentação e de protocolos claros pode transformar um ato grave em passivo trabalhista.
Como se proteger:
Para mitigar esse risco, as empresas devem:
1. Criar política interna clara proibindo o uso do expediente e de recursos da empresa para apostas, mesmo em dispositivos pessoais.
2. Monitorar condutas com critérios objetivos, como registros de acesso à internet, câmeras e testemunhas.
3. Estabelecer protocolo de investigação interna para agir com rapidez e formalidade.
4. Treinar líderes para identificar sinais de vício e conduta indevida.
5. Aplicar sanções imediatamente após a comprovação da falta, documentando todas as etapas.
O crescimento das apostas online é irreversível, mas as consequências dentro das empresas podem, e devem, ser controladas. Quem se antecipar e estabelecer barreiras jurídicas e operacionais estará mais protegido diante de um problema que, cada vez mais, será discutido nos tribunais.
1 https://www.jota.info/